Por maioria de votos, o
Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (20) que
cabe à Justiça Comum julgar processos decorrentes de contrato de previdência
complementar privada. A decisão ocorreu nos Recursos Extraordinários (REs)
586453 e 583050, de autoria da Fundação Petrobrás de Seguridade Social (Petros)
e do Banco Santander Banespa S/A, respectivamente. A matéria teve repercussão
geral reconhecida e, portanto, passa a valer para todos os processos
semelhantes que tramitam nas diversas instâncias do Poder Judiciário.
O Plenário também decidiu
modular os efeitos dessa decisão e definiu que permanecerão na Justiça do
Trabalho todos os processos que já tiverem sentença de mérito até a data de
hoje. Dessa forma, todos os demais processos que tramitam na Justiça
Trabalhista, mas ainda não tenham sentença de mérito, a partir de agora deverão
ser remetidos à Justiça Comum.
O ministro Marco Aurélio foi o
único divergente nesse ponto, porque votou contra a modulação.
Relatora
A tese vencedora foi aberta
pela ministra Ellen Gracie (aposentada) ainda em 2010. Como relatora do RE
586453, a ministra entendeu que a competência para analisar a matéria é da Justiça
Comum em razão da inexistência de relação trabalhista entre o beneficiário e a
entidade fechada de previdência complementar. De acordo com ela, a competência
não pode ser definida levando-se em consideração o contrato de trabalho já
extinto como no caso deste RE. Por essa razão, a ministra concluiu que a
relação entre o associado e a entidade de previdência privada não é
trabalhista, estando disciplinada no regulamento das instituições.
O RE 586453 foi interposto
pela Petros contra acórdão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que
reconheceu a competência da Justiça Trabalhista para julgar causas envolvendo
complementação de aposentadoria por entidades de previdência privada. A Petros
alegou que foram violados os artigos 114 e 122, parágrafo 2º, da Constituição
Federal, tendo em vista que a competência para julgar a causa seria da Justiça
Comum, pois a relação entre o fundo fechado de previdência complementar e o
beneficiário não seria trabalhista.
Após o voto da ministra Ellen
Gracie, o ministro Dias Toffoli manifestou-se no mesmo sentido do entendimento
da relatora. Na sessão de hoje, reafirmando seu voto, o ministro citou a Emenda
Constitucional 20/1998, que deu nova redação ao parágrafo 2º do artigo 202 da
Constituição Federal. De acordo com essa regra, “as contribuições do
empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos e
regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não
integram o contrato de trabalho dos participantes”.
Dias Toffoli também destacou
que a proposta trazida pela ministra Ellen Gracie “dá solução ao problema”,
porque outra alternativa manteria o critério de analisar se haveria ou não, em
cada processo, relação de contrato de trabalho. Esse mesmo entendimento foi
acompanhado pelos ministros Luiz Fux, Gilmar Mendes e Celso de Mello. O
ministro Marco Aurélio também deu provimento ao recurso, mas por fundamento
diverso.
O ministro Gilmar Mendes
destacou que, por envolver a questão de competência, a indefinição e
insegurança jurídica se projetam sobre a vida das pessoas que buscam a
complementação nos casos determinados. “Acompanho o voto da ministra Ellen
Gracie reconhecendo a competência da Justiça Comum e também subscrevendo a sua
manifestação no que diz respeito à modulação de efeito, exatamente para dar
encaminhamento a esses dolorosos casos que dependem, há tantos anos, de
definição”, afirmou o ministro Gilmar Mendes.
Também ao acompanhar a
ministra Ellen Gracie, o decano da Corte, ministro Celso de Mello, enfatizou
que “é necessário estabelecer um critério objetivo que resolva a crescente
insegurança e progressiva incerteza que se estabelece em torno dessa matéria”.
Voto-vista
O presidente da Corte,
ministro Joaquim Barbosa, apresentou seu voto-vista na sessão de hoje e
acompanhou o posicionamento do ministro Cezar Peluso (aposentado) em voto
apresentado em março de 2010, no qual defendia a competência da Justiça do
Trabalho para julgar os casos de complementação de aposentadoria no âmbito da
previdência privada quando a relação jurídica decorrer do contrato de trabalho.
Esse posicionamento ficou vencido e contou também com o voto da ministra Cármen
Lúcia. O ministro Peluso era o relator do RE 583050, de autoria do banco
Santander Banespa S/A contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul (TJ-RS).
Conforme defendeu o ministro
Peluso na ocasião do seu voto, caberia ao juiz da causa avaliar se determinados
processos iriam tramitar na Justiça do Trabalho ou na Justiça Comum. De acordo
com ele, se o processo fosse decorrente de contrato de trabalho, seria de
competência da Justiça do Trabalho, mas se a matéria não estivesse relacionada
ao contrato de trabalho, a Justiça Comum seria competente para análise do
processo.
O ministro Joaquim Barbosa
afirmou em seu voto que não vê como “segregar o contrato de previdência privada
complementar das relações de direito de trabalho eventualmente existentes entre
o indivíduo e o patrocinador, com repercussão no que tange à fixação da Justiça
Comum como a competente para o julgamento dos conflitos decorrentes desse tipo
de ajustes”.
“Refuto a tese de que o artigo
202, parágrafo 2º, poderia amparar a conclusão de que a Justiça do Trabalho não
seria mais competente para decidir as ações que envolvem o pleito de
complementação da aposentaria”, afirmou o presidente.
De acordo com a proclamação do
julgamento, a maioria dos ministros (6x3) deu provimento ao RE 586453 e, por
outro lado, negou provimento ao RE 583050, sendo que o ministro Marco Aurélio
foi o único vencido neste último.
Modulação
Também na sessão desta
quarta-feira, ao resolver uma questão de ordem, o Plenário do Supremo entendeu
necessária a maioria de dois terços dos votos – conforme previsto no artigo 27
da Lei 9.868/99 (Lei das ADIs)* – para a modulação aos efeitos de decisões em
processos com repercussão geral reconhecida. Portanto, este entendimento
formado pela maioria da Corte (5x4), quanto à exigência do quórum qualificado
nestes casos, foi aplicado hoje no julgamento do RE 586453 e será aplicado a
partir de agora em matérias semelhantes.
Cinco ministros [Teori
Zavascki, Rosa Weber, Cámen Lúcia, Marco Aurélio, Joaquim Barbosa] consideraram
que deve ser cumprido o quórum qualificado para modulação de efeitos em
recursos extraordinários com repercussão geral reconhecida. Ficaram vencidos
quatro ministros: Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello, os
quais entenderam ser possível a modulação, nesses casos, por maioria absoluta
do Tribunal.
CM,EC/AD
*Artigo 27 da Lei 9.868/99 –
Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista
razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o
Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros,
restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a
partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
Fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=231193